Décima Lição

CONSTRUÇÃO DAS PALAVRAS EM ESPERANTO; OS SUFIXOS , EC, AN, UL

147. Terá o estudante reparado na facilidade com que o Esperanto forma palavras mediante a adição dum afixo (prefixo ou sufixo) a uma raiz substantiva, adjetiva ou verbal. Analisemos agora tais palavras mais de perto, para ver o “mecanismo” dessa construção.

A) Pela adição de sufixos:

1. Ŝafaro: ŝafo carneiro (em geral), aro reunião: temos, pois, uma reunião de carneiros, isto é, um rebanho, gado lanígero.

2. Ŝipestro: ŝipo navio, estro chefe: logo, chefe de navio, isto é, comandante.

3. Sklaveco: sklavo escravo, eco qualidade, estado ou condição: portanto, condição de escravo, isto é, escravidão.

4. Ruĝigi: ruĝa vermelho, igi fazer, tornar, então, fazer (ou tornar) vermelho, seja: avermelhar.

5. Kombilo: kombi pentear, ilo instrumento, utensílio, logo, utensílio para pentear, um pente.

Observamos, assim, que iniciamos a tradução pela última parte do vocábulo, isto é, pelo conjunto “prefixo mais terminação”: essa parte dá ao vocábulo um sentido geral, de maior extensão, e, pela desinência, diz se a palavra é um substantivo, um adjetivo ou um verbo. Tais vocábulos podem, pois, dividir-se em duas partes: uma que o classifica e o define como objeto, qualidade, exprimindo uma ação etc.: a essa parte chamamos o elemento principal; a outra, que caracteriza a primeira, tem o nome de elemento acessório. Repare -se que o elemento principal vem no fim do vocábulo inteiro.

Os sufixos, bem como os prefixos, formam, com as várias terminações, palavras independentes, e, assim, pela análise dos exemplos acima oferecidos, podemos decompor estes em:

1. aro da ŝafoj; 2. estro de ŝipo; 3. eco (= stato) de sklavo; 4. igi ruĝa; 5. ilo por kombi.

B) Pela adição de prefixos:

6. Ekiri: ek, prefixo que exprime ação incoativa (isto é, incipiente, que se inicia), iri ir, andar; então, ekiri começar a andar, partir (dum lugar).

7. Disĵeti: dis, prefixo que indica separação, afastamento em diversas direções, ĵeti lançar; logo, lançar em várias direções, espalhar.

8. Refari: re, prefixo que exprime repetição da ação, fari fazer; portanto, fazer de novo, refazer.

Nestes exemplos, os elementos principais são, respectivamente, iri, ĵeti, fari, os quais, segundo vemos, ainda ocupam seu lugar, isso é, no final do vocábulo; os prefixos são os elementos acessórios.

Esses prefixos, com as terminações adequadas a casa caso, formam palavras independentes, tendo-se por conseguinte:

6. eke iri (eke = de modo incipiente); 7. disaj ĵeti (lançar de tal modo, que os objetos fiquem separados = disaj); 8. ree fari (ree = de novo).

C) As terminações gramaticais são também palavras independentes. Assim, p. ex.:

9. Internacia: existente (terminação a) entre as nações (inter nacioj), significando, pois, “internacional”.

10. Kvarpieda: caracterizado (terminação a) por quatro pés (kvar piedoj); logo, “quadrúpede” (adjetivo). O substantivo correspondente formaríamos com sufixo ul, isto é, seria kvarpiedulo.

11. Bonfarto: estado (terminação o) de passar bem de saúde (bone farti), isto é, “boa saúde”.

D) Da mesma sorte que formamos palavras pela junção de um afixo a uma raiz, podemos combinar duas ou mais palavras, ou, pelo menos, suas raízes, com a terminação própria de sua função gramatical, ou sem a terminação, ou com esta modificada. Com efeito, p. ex., banejo se decompõe em ban-ejo, exprimindo “ejo de bano” = local de banho, banheiro. Como os sufixos formam palavras independentes, podemos substituir ejo, neste caso, por ĉambro (quarto); e, então, em vez de ban-ejo, teremos ban-ĉambro = quarto de banho, podendo escrever-se numa só palavra: banĉambro. Sendo ejo (de banejo) o elemento principal, ĉambro também o será de banĉambro.

Assim também legolibro: decompomo-lo em lego-libro, isto é, livro de leitura; skribotablo: mesa (tablo) sobre a qual se escreve (skribo = escrita), isto é, escrivaninha, secretária; vivokondiĉoj: condições (kondiĉoj) de vida (vivo); etc.

Compare-se: sukerkano cana de açúcar; kansukero açúcar de cana.

148. Quando a clareza e a eufonia (= boa pronúncia) o permitam, pode omitir-se a terminação do elemento acessório, como, p. ex.: kapdoloro dor de cabeça, em vez de kapodoloro; kelkfoje algumas vezes, em vez de kelkafoje; velŝipo navio de vela, em lugar de veloŝipo. Caso contrário, não convém ou não é permitido fazê-lo, p. ex: dentodoloro dor de dentes, akvofalo, queda d’água, etc. porque dentdoloro e akvfalo seriam difíceis de pronunciar e não seriam claros ao ouvido; posteulo um póstero, indivíduo (= ulo) que vem, ou vive, depois de outrem (= poste), porque postulo significa “exigência”. Ununaskita e unuanaskita: a primeira quer dizer que é (a) um só (unu) nascido, unigênito; a outra exprime; que nasceu primeiro (unue), primogênito.

149. Lembramos que o Português forma inúmeras palavras por este mesmo processo do Esperanto, isto é, por meio de prefixos e de sufixos, como pela aproximação de duas palavras, integrais ou não: neste último caso temos as chamadas “palavras compostas” do nosso idioma, p. ex.: ferrovia, rodovia, pernilongo, etc., ou do latim, bem como do grego: terremoto, fidedigno, geografia, telefone, além de vocábulos “híbridos”: sociologia, automóvel, etc. Reconhecemos nestas palavras uma parte mais ampla e outra que a restringe, tal como no Esperanto; p. ex.: “ferrovia” = estrada de ferro; assim também diz a língua auxiliar: fervojo. Nem sempre, contudo, nosso idioma assim procede, como é fácil de verificar: em “peixe-espada, alvinitente, para-raios, passatempo, verde-mar” e tantos outros, o elemento mais extenso precede o que o limita: “peixe-espada” é um peixe (nome mais geral) do feitio de espada (restritivo). O Esperanto continua, porém, a pôr o “elemento principal” no fim da palavra: spadfiŝo.

Reparemos ainda no fato de que o Português é uma língua flexiva, pelo que os radicais e os afixos sofrem alterações frequentes; p. ex.: amigo, amicíssimo, amizade, inimigo; fazer, fiz, feito; ascender, ascensor, ascensão; forte, força; com, contanto, colaborar; etc. O Esperanto é, porém aglutinante, e, por isso, os elementos que formam suas palavras são inalteráveis: Comparemos p. ex.: a palavra neŝanĝebleco com a sua correspondente portuguesa “imutabilidade”. A raiz ŝanĝ(i) = mud(ar); ŝanĝebla = mutável; ŝanĝebleco = mutabilidade; o prefixos “in” (de negação) se transformou em simples “i”, depois de ter passado pela forma “im”: três alterações numa só palavra!

150. O sufixo indica a manifestação concreta da ideia contida na raiz; p. ex.: dolĉa doce, dolĉaĵo (um) doce (= concretização da doçura); lakto leite, laktaĵo laticínio (produto do leite); pentri pintar, pentraĵo (uma) pintura, quadro (= resultado da ação de pintar); arto arte, artaĵo objeto de arte; fajro fogo, fajraĵo fogo de artifício; prozo prosa, prozaĵo composição em prosa, trecho de prosa; ebena plano, ebenaĵo planície; heredi herdar, heredaĵo herança; amuzi divertir, amuzaĵo divertimento, diversão (= coisa para divertir); amiko amigo, amikaĵo gesto amigo, prova de amizade; ĝentila gentil, ĝentilaĵo (uma) gentileza (= manifestação da qualidade de ser gentil); infano criança, infanaĵo criancice, infantilidade; malfacila difícil, malfacilaĵo dificuldade, obstáculo; okazi acontecer, okazaĵo acontecimento; moki zombar, escarnecer, mokaĵo objeto de zombaria (alguém ou alguma coisa de que se escarnece, isto é, mokata).

151. O sufixo ec mostra a qualidade ou o estado; p. exemplo: bela belo, beleco beleza; mola mole, moleco moleza; amiko amigo, amikeco amizade; alta alto, alteco altura; sklavo escravo, sklaveco escravidão; trankvila tranquilo, trankvileco tranquilidade; sola só, sozinho, soleco solidão, isolamento.

NOTA — Este sufixo presta-se à formação de adjetivos em -eca, com o sentido de “semelhante a, da natureza de”; p. exemplo: vitreca rigardo — olhar vidrado; rokeca tero — terra rochosa; deserteca silento — silêncio do deserto (= semelhante ao dum deserto); malsaneca flavo — cor amarela de doente.

152. OBSERVAÇÃO — Note-se a diferença entre os sufixos ec e . Para maior clareza, vejamos os seguintes exemplos: O Brasil é muito rico; sua riqueza é imensa; o café é uma das suas maiores riquezas — Brazilo estas tre riĉa; ĝia riĉECO estas grandega; kafo estas unu el ĝiaj plej grandaj riĉAĴoj. Essa astúcia deu em nada: nem sempre ajuda a astúcia — Tiu ruzaĵo donis nenion: ruzECO ne ĉiam helpas.

153. O sufixo an indica membro (ou) sócio, partidário, habitante; p. ex.: klubo clube, klubano sócio dum clube; akademio academia, akademiano acadêmico; Kristo Cristo, kristano cristão; Mahomet Maomet, mahometano (um) maometano; Parizo Paris; parizano parisiense; Brazilo Brasil, brazilano (um) brasileiro, Ameriko América; amerikano (um americano).

154. O sufixo ul indica um ser caracterizado pelo que exprime a parte radical da palavra; p. ex.: juna jovem, moço (adjetivo), junulo, moço (substantivo), junulino moça; almozo esmola, almozulo mendigo; malsana doente, malsanulo (um) doente; bela belo, belulino beleza (= mulher bela); dupieda bípede dupiedulo (um) bípede (pessoa ou animal); krusto crosta, krustulo (um) crustáceo; alia outro, aliulo outrem, aliula de outrem, alheio; junulaj petolaĵoj travessuras de jovem (ou “de jovens’).

Exercício n.º 19

Vocabulário

Aparta — à parte.
Apetito — apetite.
Atesti — testemunhar.
Cikonio — cegonha.
Ĉagreni — afligir, desgostar.
Drinki — beber em excesso (alcoólicos).
Droni — afogar-se.
Ekzekuti — executar (criminoso).
Eltiri — tirar, extrair.
Fluida — fluido, líquido.
Fotografi — fotografar.
Frandi — petiscar, apreciar (gulodices).
Glacio — gelo.
Gorĝo — garganta.
Gusto — gosto.
Informi — informar.
Kamparo — campo, campina.
Kia — que.
Krimo — crime.
Lano — lã.
Lupo — lobo.
Mensogi — mentir.
Monto — monte.
Osto — osso.
Pastro — padre, sacerdote.
Paŝti sin — pastar.
Prediki — pregar, fazer prédica.
Regno — país.
Savu — salvar
Senco — sentido, significado, nexo.
Senkulpa — inocente.
Signifi — significar.
Sufoki — sufocar.
Tia — tal.
Tio — isso, aquilo, o.
Vilaĝo — aldeia.
Virga — virgem.
Vulpo — raposa.

Drinkante kaj ludante, tiu viro perdis sian tutan havaĵon. Nin ne ĉagrenu la homaj maljustaĵoj, ĉar granda estas nur la Justeco de Dio. Mi manĝis tre bongustan dolĉaĵon. La loĝantoj de unu regno estas samregnanoj. La heroeco de Petro estas laŭdita de ĉiuj; savinte dronantan infanon, li faris veran heroaĵon. Sur tiu herboriĉaj kamparoj paŝtas sin bellanaj ŝafoj. Usonanoj estas progresemaj homoj. Mi estas informita, ke la krimulo estas baldaŭ ekzekutota. Tiu junulo faras nur sensencaĵojn; li estas ventkapulo, sed ne mensogema. La vera kristano havas purecon en sia koro. Pano estas la plej bona manĝaĵo. En la urboj loĝas riĉuloj kaj malriĉuloj.

La fotografisto fotografis min, kaj mi sendis mian fotografaĵon al mia patro. Akvo estas fluidaĵo. Ĉi tiu pentraĵo estas perfektaĵo de beleco. Tiu ĉi granda altaĵo ne estas natura monto. La alteco de tiu monto ne estas tre granda. Glaciaĵo estas dolĉa glaciigita frandaĵo. Urbanoj estas ordinare pli ruzaj, ol vilaĝanoj. Malsaĝulon ĉiu batas. Preĝu al la Sankta Virgulino.

“Kion manĝis hodiaŭ via edzo?” demandis kuracisto la edzinon de malsana kamparano. “Bovaĵon”, respondis la virino. La kuracisto demandis ankoraŭ: “Ĉu kun apetito?” Kaj la kamparanino, ne komprenante la signifon de tiu vorto, diris: “Ne, sinjoro doktoro; ni ne povas (= podemos) aĉeti tian manĝaĵon, ĉar ni estas malriĉaj.”

Pastro diris en prediko, ke Dio ĉion (= tudo) faris bone. Post la prediko demandis la pastron iu ĝibulo: “Sinjoro pastro, rigardu min: ĉu ankaŭ min Dio faris bone?” Kaj la pastro respondis: “Certe, amiko, por esti ĝibulo, vi estas bone farita.”

Lupo estis baldaŭ mortonta kaj pensis pri sia pasinta vivo. “Certe”, li diris, “mi estas pekulo, sed mi pensas, ke ne unu el la plej grandaj. Mi faris malbonaĵojn, sed ankaŭ bonaĵojn Foje ŝafido, apartiĝinte de la ŝafaro, venis tiel proksimen (= perto) de mi, ke mi povus ĝin preni (= agarrar) kaj manĝi, sed mi ne faris tion; mi lasis (= deixei) ĝin vivi. “Vulpo, kiu aŭdis tiujn parolojn de la lupo, diris: “Mi mem povas atesti, ke tio estas vera: mi scias, ke tio okazis en tiu tempo, kiam ci estis preskaŭ mortanta de sufokiĝo, pro la osto, kiun la bonkora cikonio eltiris el cia gorĝo.”

MÉTODO DIRETO.

Kial (= por que) tiu viro, kiu drinkadis kaj ludadis, perdis sian tutan havaĵon? (Respondu: Porque fazia dívidas, perdia dinheiro e não trabalhava.) Ĉu la homa justeco estas neerarema? Kiel estas nomataj la loĝantoj de unu urbo? Kian heroaĵon Petro faris? Ĉu la krimulo estas jam ekzekutita? Kion demandis la kuracisto, kiam la kamparanino diris, ke ŝia edzo manĝis bovaĵon? Kion tiu virino respondis? Kial ŝi tiel respondis? Kiu demandis la pastron? Kion li demandis? Kion la pastron respondis? Pri kio pensis la baldaŭ mortonta lupo? Ĉu li estis senkulpulo? Pri kiu ŝafido li parolis al la vulpo? (Respondu: A respeito do cordeiro que ele poderia..., mas...). Kiam okazis tiu bona ago (= ação, gesto ) de la lupo?

Exercício n.º 20

Vocabulário

Alma — Animo.
Amparar — Subteni.
Andar — Iri.
Buscar — Serĉi.
Caminhar — Iri.
Camisa — Ĉemizo.
Cantar (galo) — Krii.
Conto — Rakonto.
Cor-de-rosa — Rozokolora.
Elevar-se — Leviĝi.
Embevecimento — Raviteco.
Em torno de — Ĉirkaŭ.
Exterior (adj.) — Ekstera.
Fera — Rabobesto.
Interior (adj.) — Interna.
Inventar — Elpensi.
Limiar — Sojlo.
Noite — Vespero.
Paisagem — Pejzaĝo.
Real — Reala.
Valer — Valori.

Uma vez em cada semana o nosso querido pai lia para (al) nós um trecho de prosa, para nos fazer ver a beleza do mundo. Uma noite leu a história daquele (pri tiu) menino mais feliz da (sur la) Terra: não tinha camisa! Perguntamos, então, ao pai como alguém poderia ser feliz não tendo sequer () uma camisa.

— Este conto — respondeu — é pura invenção, e nós devemos buscar-lhe o sentido (= buscar o seu sentido). Camisa é uma coisa exterior, que pouco vale diante do interior do homem. Esse menino era plenamente (tute) feliz, porque tudo via cor-de-rosa: cantava com (kune kun) os pássaros, saudava a luz do Sol, dormia sem recear (= não receando) as feras; a todos olhava como irmãos, criaturas do mesmo Deus. Era cristão e orava; e quem ora, é (= esse é) feliz. Essa noite eu fiz a prece mais ardente de (en) minha vida; e nesse embevecimento duma alma que se eleva da baixeza da Terra até o limiar da celeste morada, adormeci e pus-me a caminhar como que amparada por mãos invisíveis. Não, isso não era sonho; sua realidade era demasiado viva! Em torno de nós — eu disse “nós”? — sim, em torno de nós a paisagem era muito diferente das (ol tiuj) terrenas. E andei e andei... Depois, tudo de repente escureceu; comecei a ouvir um galo a cantar... Era (Ĝi estis) a volta à realidade, mas, eu perguntaria: qual (kia) a realidade maior?